Há algum tempo, publiquei um texto em que discutia sobre novos autores da teledramaturgia brasileira e como essa nova leva de profissionais estava dando uma repaginada nas produções nacionais. Na época, Avenida Brasil, de João Emanuel Carneiro, estava em sua reta final, sendo considerada um dos maiores sucessos do horário das 9. Nessa semana, Glória Perez entrega sua tímida Salve Jorge, que chegou ao seu último capítulo como a novela de menor audiência da história do horário – refletindo diretamente os problemas crônicos que nossas emissoras vem sofrendo para criar tramas de qualidade e que agrade o público.
Autora de sucessos de público e crítica como Barriga de Aluguel e O Clone (mas também de fiascos como América e Caminho das Índias), Glória diz que teve a sensação de dever cumprido. Sempre trazendo às suas obras temas polêmicos e de caráter social (como clonagem humana, emigração e homossexualismo), Glória levou à Salve Jorge o drama do tráfico de mulheres, tendo como principal personagem a jovem Morena (vivida pela insossa Nanda Costa – criticada do início ao fim da trama). A novela, cujo cenário se dividia entre o Complexo do Alemão e a Turquia, não decolou e pior: virou motivo de piada nas redes sociais por inúmeros motivos.
O primeiro deles é simples, é direto: a trama não é boa. Definitivamente não é a tipo mais adequada para o horário. Glória optou por trazer uma abordagem mais “policial” para um produto que já está batido, já está cravado na imaginação dos brasileiros. Okay, outras produções já tiveram o mesmo apelo no horário e se deram bem, mas é aí que reside o segundo problema: a abordagem foi mal feita. Ao longo dos meses, o que se viu foi uma série de erros, incoerências e furos de roteiro que distanciaram a novela do gênero policial e a transformaram em um verdadeiro circo. Na internet, havia fóruns que sobreviviam apenas em descobrir os erros abruptos cometidos durante os capítulos – e eram muitos. Okay, Glória é novata no gênero. Além disso, ela é uma das poucas autoras globais que escreve sem colaboradores – portanto, alguns erros são justificáveis, afinal escrever novela é complicado. Mas nenhum telespectador (por mais pobre intelectualmente que seja) consegue assistir uma trama sem nexo.
Outro problema de Salve Jorge foi o excesso de personagens “orelha” (sabe aquele personagem que só aparece para contracenar como coadjuvante de outros coadjuvantes?). Isso causou um clima entre o elenco, quando muitos atores reclamavam de seus papéis insignificantes (o que é justificável). Tinha personagem que simplesmente não tinha razão para existir. Vera Fischer foi uma das que reclamaram e declarou que sua personagem não acrescentou nada à carreira da atriz. Tenso, hein? Mesmo os protagonistas da história não colaboraram. Nanda Costa, definitivamente, não era a escolha ideal. Rodrigo Lombardi, que nunca foi grande coisa, também não convenceu sendo “o cara”. Foi nesse ambiente que se destacavam personagens menores, como a delegada Helô (vivida pela sempre muito inspirada Giovanna Antonelli) e seu marido Stênio, Maria Vanúbia (com todo seu recalque) e a traficada Jéssica (pequena participação de Carolina Dieckmann no início da novela).
Vale a pena comentar sobre os vilões? Sim. Cláudia Raia, que sempre brilha, dessa vez não conseguiu fazer um bom trabalho como Lívia. Talvez o público não tenha tido aquele interesse na personagem porque vínhamos de uma vilã inesquecível (Carminha, de Avenida Brasil, vivida por Adriana Esteves, em seu personagem mais marcante), mas o fato é que Cláudia não cumpriu com a promessa de criar uma vilã melhor – o que, certamente, era possível, pois Cláudia Raia é uma ótima atriz. Com isso, abriu caminho para Totia Meirelles, que deu toda humanidade à sua personagem Wanda e se tornou um dos poucos personagens bons da trama. E aquele personagem Russo segurando um gatinho a todo tempo? Mais parecia vilão de filme infantil!
Definitivamente, Salve Jorge foi uma novela ruim. Glória diz que não entende as críticas e o fracasso da trama, mas a verdade é que a Salve Jorge é ruim. Não há outra explicação. Em uma época em que a TV briga diretamente com o computador pela atenção do público, fazer novela tem sido um grande desafio. Mesmo as produções atuais de maiores sucessos não chegam a ter a mesma audiência que trabalhos simples tinham há 10 ou 15 anos atrás – mas isso não impede a uma autora como Glória criar uma novela totalmente à deriva. A autora já revelou que não fará mais história onde as tramas se passam em outro país, pois, segundo ela, “é muito trabalhoso”. Trabalhoso para o público é ver gente falando português nos lugares mais remotos do mundo, Glória…

Cláudia Raia fazendo homenagem à Dita Von Teese? Brega – mas talvez a melhor coisa que Cláudia fez na novela…
Salve Jorge foi motivo de piada até mesmo no último capítulo. Com tudo mal resolvido, personagens que sumiram sem explicação, cena brega, conversão religiosa e tudo mais, a novela abre espaço para Amor à Vida, de Walcyr Carrasco (autor de sucessos no horário das 6 que assina sua primeira novela no horário) que parece beber na fonte das receitas antigas, especialmente de Manoel Carlos, apostando em uma abordagem recheada de histórias de amor e família – mas com muito mais polêmica, como já está rolando por aí. Ao menos, não teremos de aturar as trapalhadas de uma trama sem nexo, com personagens que não nos cativam e não acrescentam em nada à nossa teledramaturgia. Ah, e claro: também não teremos que aturar a música de Roberto Carlos…
Okay, é melhor esperar para conferir…