“Violência vende”, já dizia o cineasta Quentin Tarantino. O mesmo Tarantino que, há algumas semanas, divulgou sua famosa lista com os melhores filmes do ano em sua modesta opinião de gênio do cinema. Na lista, estava presente a continuação de Kick-Ass – Quebrando Tudo (2010), baseado nos quadrinhos da dupla Mark Millar e John Romita Jr. Obviamente, devido ao sucesso instantâneo da produção de 2010, não seria surpresa que uma sequência fosse realizada. E assim, chega aos cinemas brasileiros na próxima semana Kick-Ass 2 – este baseado nos quadrinhos Kick-Ass 2 Prelude: Hit-Girl e Kick-Ass 2 (respectivamente, o segundo e o terceiro livro da série).
Jeff Wadlon encarou o desafio de dirigir o longa – e bota desafio nisso, afinal fazer a sequência de um filme como Kick-Ass – Quebrando Tudo é, no mínimo, arriscado. É o tipo de produção que pode levantar ou afundar a carreira de qualquer cineasta, dependendo de sua performance. Aqui, faço uma pergunta: você assistiu Kick-Ass – Quebrando Tudo? Caso a resposta seja positiva, continue o texto. Do contrário, sugiro que interrompa a leitura e assista. Kick-Ass – Quebrando Tudo é muito bom. Muito bom mesmo. É o típico filme em que você não espera absolutamente nada e facilmente entra na lista de favoritos de qualquer ser humano comum.
Não é um exagero. Kick-Ass – Quebrando Tudo reúne tudo aquilo que um filme precisa para ser bem sucedido: tem bom roteiro, atuações, história, produção, boa trilha sonora… A história do garoto Dave (que em um belo dia, decide colocar uma roupa de mergulho e sair pelas ruas lutando contra o crime – mesmo sendo um adolescente comum) caiu no gosto do povo por sua mistura explosiva de violência e humor – criando uma franquia de sucesso imediato.
Kick-Ass 2 acompanha agora os personagens Dave e Mindy, respectivamente, o Kick-Ass do título e a garota Hit-Girl. Enquanto Dave se esforça para se tornar um herói de verdade (participando, inclusive, de um grupo de “heróis” formado por pessoas comuns, o Justice Forever), Mindy passa por uma crise de “identidade”, pois é obrigada por seu pai adotivo a abandonar as armas
e peruca roxa S2 e viver uma vida comum como as adolescentes de sua idade (que usam maquiagem, ouvem One Direction e curtem a saga Crepúsculo). Paralelamente, Chris D’Amico surge como Mother Fucker, reunindo um time de vilões da vida real com o intuito de matar Kick-Ass e vingar o pai (morto pelo nosso herói no filme anterior).
O filme tinha tudo para dar certo – e realmente deu certo. Kick-Ass 2 é uma boa produção. No entanto, Kick-Ass 2 fica abaixo da primeira parte da saga. Olha, tenho que confessar: muito do que eu falo aqui é minha opinião pessoal. Tem gente por aí que amou a trama (veja o exemplo de Tarantino aí) e o acha bem superior ao primeiro, mas não me convenceu por completo. Isso tanto é verdade que Kick-Ass 2 foi um fiasco nas bilheterias norte-americanas (o que levanta os debates sobre uma terceira sequência) e tem um índice de avaliação bem menor do que o primeiro longa da série.
O problema principal em Kick-Ass 2 é que ele perdeu aquele tom “maroto” do primeiro longa. O filme é muito mais dark, mais “adulto” do que o primeiro – a começar por suas personagens. Dave, por exemplo, era um garoto raquítico que se masturbava no quarto enquanto assistia vídeos pornôs; hoje, ele é um cara bombado que tenta levar a profissão de herói a sério. Mindy (céus, o que fizeram com você?) era uma garotinha que soltava palavrões e manipulava facas; hoje, é uma adolescente em crise que flerta com Dave (contrariando os quadrinhos, cuja história não permite tal envolvimento – ao menos até o terceiro livro). Chris era um adolescente solitário que lia mangás; hoje é um vilão sedento por vingança que mata a mãe por acidente (compromisso com os quadrinhos, cadê?).
Outro ponto: está certo que Dave nunca foi um herói de verdade e boa parte do sucesso de Kick-Ass – Quebrando Tudo se deve a outros personagens – mas o protagonista da história ainda é o adolescente. Em Kick-Ass 2, Dave é quase um antagonista, dividindo os holofotes explicitamente com Mindy (o que é justificável pelo fato desta segunda parte ser baseada também nos quadrinhos Hit-Girl). O problema é que Mindy, como já citado, cresceu e não tem mais aquela graça toda de Quebrando Tudo. Ela ainda é
fodona linda, boa de briga e corajosa – mas falta aquele encanto e meiguice de criança que só víamos quando ela fazia cara de nojinho e lutava contra o crime. Foco na personagem? Sim. O filme é da Hit-Girl, minha gente!
De resto, Kick-Ass 2 tem uma boa pegada, sim. Nas atuações, destaque inevitável para Chloe Moretz, que a cada dia mostra que tem um brilhante futuro pela frente. Ao vê-la na pele da heroína Hit-Girl, a gente não acha mais graça na garotinha
boca suja do primeiro filme – mas enxergamos uma atriz que sabe o que fazer na hora de atuar. Jim Carrey, como Coronel Estrelas, consegue se sair bem sem exagerar – o que deve ser algo bem difícil para o ator. Aliás, o mesmo Jim Carrey se recusou a promover a fita pelo excesso de violência nele, veja você… Aaron Taylor-Johnson, muito mais maduro (e por isso mesmo, menos carismático na pele do adolescente principal), mostra que é uma das promessas de sua geração – aliás, já viu como o cara está saradão? Christopher Mintz-Plasse também convence como Mother Fucker, apesar de sua personagem em si não conseguir ser um vilão tão bom quanto o de Mark Strong no primeiro longa.
O filme ainda tem ótimas cenas de pancadaria e humor – justamente o que marcou a saga. O que me preocupou aqui é o fato de que o diretor não conseguiu dosar muito bem estes dois momentos: ora adulto demais, ora bizarro demais (você vai entender ao ver a cena de Mindy rebatendo as provocações de umas patricinhas do colégio). A trilha sonora continua dando o ritmo frenético às cenas – recheadas de sangue, facadas, correria e explosões. Um ponto técnico fraco da produção, no entanto, fica por conta da edição – que me pareceu meio atropelada e me dava a sensação de que eu havia perdido algo enquanto piscava os olhos.
Como produto final, Kick-Ass 2 está abaixo do nível do primeiro, mas nem por isso se torna uma atração ruim. Talvez pela novidade do primeiro roteiro, a história de Kick-Ass 2 não impressiona muito. Assim como Kick-Ass – Quebrando Tudo, esta sequência fecha sua história nos deixando uma pequena ponta para uma continuação – e que talvez seja necessária para encerrar com maestria a saga. Apesar de não ser totalmente fiel aos quadrinhos (afinal, romance entre Mindy e Dave? ONDE? CADÊ?), a trama consegue convencer, ainda que não tanto quanto na primeira parte. É um filme forte, graficamente colorido e que enche os olhos com suas cenas bem montadas. Só deixa aquela sensação de “poderia ser melhor” tanto para os fãs do primeiro longa quanto para os leitores dos quadrinhos – cuja história e desfecho é, definitivamente, melhor. Com muito sangue, pancadaria e humor, Kick-Ass 2 é um ótimo produto de entretenimento – mas apenas bom se comparado ao primeiro.