No início dos anos 2000, um caso ganhou notoriedade na Holanda e se repercutiu pelo mundo: a enfermeira Lucia de Berk foi acusada da morte de sete pacientes, entre crianças e idosos. Considerada a pior serial-killer da história holandesa, Lucia foi condenada à prisão perpétua em 2003, sendo inclusive considerada culpada por três tentativas de assassinato. Após mais de seis anos na cadeia, finalmente em 2010 o então procurador-geral holandês, Harm Brouwer, reconheceu o erro no processo judiciário, perdoando a pena de Lucia e se desculpando publicamente àquela que sempre afirmou ser inocente das acusações.
Baseado na história da enfermeira e pré-indicado holandês ao prêmio de melhor filme estrangeiro na última edição do Oscar, Lucia de B. é um thriller que apresenta um roteiro com grande potencial. Há uma visível distância entre o drama pessoal de Lucia e sua família e as sequências no tribunal – o que de tudo não atrapalha a narrativa. Pelo contrário: talvez é essa lacuna que cause a dúvida no espectador – afinal, ela é culpada ou não pelos crimes? Essa incerteza quanto a Lucia fica ainda mais ressaltada devido ao bom desempenho da atriz Ariane Schluter: a protagonista é fria, sóbria, distante, carregando no olhar um tipo pesado e sem o menor sentimento que leva o público a acha-la uma vilã, uma mulher amargurada e com passado favorável à sua sentença.
Infelizmente, Lucia de B. não consegue manter o bom ritmo inicial, especialmente em sua terceira parte – onde o roteiro se apressa em buscar uma solução que é praticamente esperada (mas isso é justificável, afinal trata-se de um acontecimento real). Também poderia ter se aprofundado ligeiramente na questão midiática e seus interesses, explorando mais este universo bastante controverso. Com direção competente de Paula Van Der Oest, Lucia de B. ainda assim é um grande filme, ignorado pela massa mas que tem seu devido valor. Com uma trilha sonora discreta e uma fotografia que preza o jogo de luz e sombras, Lucia de B. proporciona um debate interessante e pontual sobre as fraquezas do sistema jurídico criminalista– fugindo totalmente dos dramalhões americanos rodados em tribunais.