Eu, Tonya (I, Tonya)

A patinação no gelo é um esporte que ostenta charme, elegância, sofisticação – justamente o oposto da personalidade efusiva de Tonya Harding. Da infância pobre marcada pela relação conturbada com a mãe à ascensão no meio esportivo, Tonya tornou-se famosa não apenas por sua capacidade técnica mas também pelo escândalo que destruiu sua carreira: às vésperas dos Jogos Olímpicos de 1994 (naquela que seria sua segunda participação), Tonya foi acusada de planejar, ao lado do marido Jeff Gillooly, o ataque que tentou incapacitar uma de suas principais concorrentes, Nancy Kerrigan.

A grande dificuldade em se produzir cinebiografias é fugir do formato tradicional deste tipo de narrativa: a estrutura, em geral, já vem “pronta” e muitas vezes fica limitada aos eventos que buscam relatar. Eu, Tonya, por sua vez, é uma grata surpresa nesta temporada e suas maiores virtudes são a quebra da “quarta parede” e a atmosfera de falso documentário que permeia a trama. Não, esses elementos não são totalmente originais, sabemos disso; mas o roteiro de Steven Rogers (de Lado a LadoP.S. Eu te amo) consegue manipula-los de maneira inteligente, o que valoriza esta história que, sobretudo, discute o feminismo com uma abordagem irreverente, fora do comum.

Com uma performance deslumbrante, Margot Robbie é a estrela da fita. Esta é, provavelmente, sua melhor atuação até aqui (aos 27 anos, a loura coleciona bons títulos em sua filmografia) e fatalmente lhe renderá uma indicação ao premio de melhor atriz no Oscar. A intérprete faz de Tonya uma protagonista com incrível carisma e empatia, ainda que suas ações nem sempre sejam vistas com bons olhos. O público torce por Tonya, mas sabe que a garota precisa tomar um rumo na vida – seja posicionando-se frente à mãe exigente (a excepcional Allison Janney), como também dando um “chega pra lá” no marido agressor (um Sebastian Stan muito eficiente, outro grande desempenho no elenco).

Embalado por uma trilha que evoca as sonoridades das décadas de 80/90, Eu, Tonya chega de mansinho, mas se mostra uma das cinebiografias mais interessantes desta temporada. Ao “quebrar” a estrutura usual do gênero, o filme de Craig Gillespie apresenta uma fórmula não convencional para narrar uma história atípica, inusitada e polêmica, cujos personagens não são lá exemplos a serem seguidos, é verdade; pelo contrário, são tipos problemáticos que estão sujeitos a todo e qualquer tipo de sentimento. O que os diferencia são as atitudes que tomam diante dos acontecimentos de suas vidas. Eu, Tonya é uma obra sobre escolha e como elas nos afetarão em algum momento.