Ainda que eu não mantenha grande admiração pelo trabalho de Christopher Nolan, é impossível para mim ficar indiferente a qualquer obra do cineasta. Questão exclusiva de afinidade, seu estilo e suas escolhas não me agradam – e, para ser honesto, apenas a trilogia The Dark Knight me chamou realmente a atenção até aqui, ao ponto de me fazer levantar da poltrona do cinema e aplaudir seu último capítulo sem me importar com a opinião alheia. Talvez o que realmente me incomode no artista são seus fãs: Nolan não é um deus, tampouco sua filmografia irretocável. Há quem o acuse de um didatismo exacerbado; eu, particularmente, torço o nariz para suas teorias incríveis que, definitivamente, não me descem. Dito isso, partamos para Dunkirk.
A trama de Dunkirk é relativamente simples e narra os feitos da (nem tão conhecida) Operação Dínamo, que envolvia a retirada da Força Expedicionária Britânica e outros aliados do porto de Dunkirk, na França, cercado pelas tropas nazistas no início da Segunda Guerra Mundial. A história é desenvolvida em três núcleos distintos que, aos poucos, se fundem: em uma praia, onde um jovem soldado e seu amigo lutam pela sobrevivência; no ar, onde um piloto trava uma acirrada batalha contra os aviões inimigos; e no mar, onde um civil parte em seu barco para ajudar no resgate do exército de seu país.
Dunkirk, como tudo aquilo que Nolan se propõe a fazer nos últimos tempos, é ambicioso, sobretudo no que se refere à técnica. Nolan nos entrega um filme, no mínimo, muito bem projetado: da espetacular fotografia (carregada de um cinza denso, pálido e angustiante) aos efeitos visuais e sonoros precisos, Dunkirk é uma aula de cinema. Lembram-se quando, no ano passado, Mad Max: Estrada da Fúria dominou o Oscar, faturando todos os prêmios técnicos da noite? Não me surpreenderia se, em 2018, o mesmo acontecesse com Dunkirk. Neste quesito, o único ponto que pode dividir a opinião é a trilha sonora assinada pelo veterano Hans Zimmer. Apesar de bem executada, sua onipresença incomoda em alguns momentos, principalmente naqueles em que o silêncio claramente faria mais sentido ou causaria maior impacto. Por outro lado, a composição gera um clima de tensão a todo instante e é feliz ao fazer do “tempo” um antagonista na história. Se o tempo já é praticamente um personagem nos roteiros do cineasta (afinal, ele o manipula das mais variadas formas, quase criando um novo tipo de estrutura narrativa), ele assume em Dunkirk um papel especial, que é construído minuciosamente com os acordes aterrorizantes de Zimmer, como o tique-taque de um relógio. A sensação óbvia é a de que os segundos, minutos, horas estão passando cada vez mais rápido – e é preciso fazer algo o quanto antes para sobreviver.
Entretanto, se Nolan é constantemente criticado por seus enredos mirabolantes, aqui ele opta por algo muito mais trivial. Não há desenvolvimento de personagem algum (na verdade, não há protagonistas), os diálogos são escassos e o argumento se concentra basicamente na tensão dos indivíduos em meio ao caos da guerra. Naquele ambiente hostil, eles são pessoas comuns diante do medo, da insegurança, da incerteza e aguardam por uma absolvição que não sabem, ao certo, se virá ou não. Ainda assim, não ocorre uma aproximação com o público: é como se a experiência sensorial funcionasse muito mais ao espectador de forma individual, mas não por uma questão de empatia. Isso limita Dunkink a um filme que, apesar de todas as suas qualidades, está longe de ser marcante. Alguns defensores mais fervorosos do diretor dizem que este é o longa de guerra definitivo, um divisor de águas no gênero. Infelizmente, não é isto o que acontece. Dunkirk é um uma ótima produção, daquela capaz de te fazer pular da cadeira do cinema e roer as unhas de agonia, mas que depois que acaba você percebe que nada mudou. E a vida continua.