É sempre interessante ver um intérprete de um único gênero arriscar-se em um projeto diferente daquilo com o qual está acostumado, pois é aí que o artista tem a oportunidade de expandir seu trabalho e provar seu talento. Talvez por esta razão a crítica tem sido tão generosa com Jennifer Aniston por sua atuação em Cake – Uma Razão Para Viver. A atriz, que ficou conhecida no seriado Friends e por suas comédias românticas de qualidade duvidosa, nos entrega nesta fita uma performance segura, comovente e, de longe, a melhor de sua carreira – e, provavelmente, o ponto mais favorável em um filme sem muito brilho.
Na trama, Aniston (que abriu mão de toda sua vaidade, chegando até a ganhar uns quilos para compor sua personagem) é Claire Simmons, uma mulher depressiva e traumatizada, que sofre com dores crônicas por todo o corpo. Em determinado momento, Claire busca ajuda em um grupo de apoio para mulheres na mesma situação – e descobre o suicídio de Nina (a simpática Anna Kendrick), uma das integrantes daquele meio. Obcecada pela história da moça e assombrada por seu fantasma, Claire passa a investigar a vida da jovem suicida, se aproximando cada vez mais da família de Nina e desenvolvendo uma relação inesperada com seu marido (Sam Worthington).
O roteirista estreante Patrick Tobin acerta na construção de sua protagonista. Claire é uma personagem que vai se revelando aos poucos: a cada instante descobrimos algo novo sobre ela – e isso é importante para que possamos entender suas motivações. Se no início da fita ela é apenas uma mulher amargurada que destila veneno para tudo e todos, logo vamos juntando as peças do quebra-cabeça. Ela se entope de medicamentos para amenizar as dores físicas que tanto a incomodam; no entanto, as dores físicas não são nada perto das psicológicas: ela é divorciada, perdeu o filho anos atrás e não tem a menor motivação para viver. Falta apenas uma coisa para Claire seguir os mesmos passos de Nina: coragem – e talvez seja isso que a personagem tanto busque no decorrer do longa.
A condução da trama, no entanto, é o que deixa a desejar: apesar de durar pouco mais de uma hora e meia, Cake é arrastado e sofre com sequências em que é visível a pretensão do cineasta Daniel Barnz em elevar a carga dramática do filme, como se para valorizar sua história. Fica evidente que o tiro sai pela culatra e nem mesmo a entrega de Aniston é capaz de fazer milagre. Cake carece ainda de uma identidade: previsível em alguns momentos, às vezes parece que o filme é uma compilação de vários outros dramas desfragmentados, que estão ali juntos com algum propósito que nunca fica muito claro. Com uma fotografia moderna (que me lembrou muito David Cronenberg em Mapas Para as Estrelas) e uma trilha sonora que merece certa atenção, o maior mérito de Cake é Jennifer Aniston – uma pena que o produto final não tenha o mesmo carisma de sua intérprete.