O Julgamento de Viviane Amsalem é um filme relativamente simples. Indicado ao Globo de Ouro 2015 na categoria de melhor produção estrangeira, a trama acompanha Viviane, uma mulher israelense que luta desesperadamente na justiça para conquistar o divórcio. O problema é que para que um casamento possa ser desfeito naquele país, ambos os lados precisam concordar com o fato – e como o marido se nega veementemente a conceder a liberdade a Viviane, o caso vai parar em um tribunal de rabinos (composto exclusivamente por homens), que tem o poder de validar ou não o divórcio.
O maior trunfo de O Julgamento de Viviane Amsalem está na competência de um roteiro que prende o espectador do início ao fim – apesar das quase duas horas de projeção e da história se passar quase que inteiramente em um único ambiente: toda a narrativa se desenvolve dentro da pequena sala do tribunal, entre as idas e vindas de um julgamento que durou mais de cinco anos. Não há tomadas externas, não há planos sequência ou nenhuma extravagância: de forma direta, o filme aposta em bons diálogos (que até criam momentos ligeiramente cômicos) e as interpretações de um elenco comprometido – com destaque inevitável para a protagonista vivida por Ronit Elkabetz (que também divide a direção do longa com Shlomi Elkabetz). É interessante notar o quanto a atriz consegue transmitir todo o sofrimento, cansaço e opressão de sua personagem conforme o tempo passa e sua situação não chega a nenhum desfecho. Simon Abkarian, por sua vez, é o cônjuge irredutível, capaz até mesmo de nos irritar com tamanha obsessão por Viviane.
Outro ponto que deve ser mencionado ainda é que o argumento não se preocupa em explicar as razões de nenhum dos personagens. Quando Elisha se recusa a dar o divórcio, não sabemos suas reais motivações – ele apenas diz que ama a esposa e pronto. Quando Viviane diz que não deseja mais viver junto aquele homem, não há circunstâncias claras – ela somente admite que os gênios são incompatíveis e ele não a faz feliz (o que já seria suficiente para o casamento ser anulado, cá entre nós). O filme só se sustenta naquilo que as partes alegam e nos testemunhos das demais pessoas – e é justamente isso que cria certo distanciamento e nos permite “julgar” o caso com maior sobriedade. Estamos em pleno século XXI e é inadmissível que a mulher tenha que brigar por algo que é seu por direito: a liberdade. Mas veja bem: O Julgamento de Viviane Amsalem estende o significado da palavra “liberdade” ao levantar este debate. Ainda hoje, as mulheres recebem salários inferiores aos dos homens; possuem menos cargos políticos; são vistas como o sexo “frágil” ou constantemente ridicularizadas e estereotipadas em humorísticos televisivos. É difícil admitir, mas existem milhares de “Vivianes” pelo mundo afora, precisando ser ouvidas e devidamente respeitadas. O Julgamento de Viviane Amsalem escancara uma triste realidade da nossa contemporaneidade – mas proporciona ao público um instante de reflexão, tornando-o muito além de um mero produto cinematográfico.