“O amor é a coisa mais triste quando se desfaz…”, já dizia uma velha canção popular brasileira. De fato, quando o amor acaba sempre há um lado que sai machucado – ou vários. Para Miriam (Léa Drucker) e Antoine (Denis Ménochet), a separação é inevitável – o que resta agora é brigar na justiça pela guarda do filho Julien (Thomas Gioria).
Xavier Legrand tem dois grandes méritos com Custódia. O primeiro deles é ótimo roteiro, que abraça a ambiguidade para construir uma narrativa inquietante. “Eu não sei qual dos dois é o mais mentiroso…”, diz a juíza ao casal durante a audiência que determina a custódia compartilhada da criança. Esta afirmação, porém, é a mesma que fazemos: ficamos na dúvida se o depoimento do garoto foi manipulado pela mãe, como se ele estivesse sendo usado por ela para se vingar do ex-marido, ou se, de fato, estamos diante de um pai agressivo. Esta dúvida nos persegue durante as duas primeiras partes do filme, uma vez que não conseguimos definir de imediato quem é quem nesta história. Aos poucos, no entanto, vamos desnudando a verdadeira relação entre aqueles familiares, através de pequenas situações que revelam a natureza de cada um dos personagens.
O segundo acerto de Legrand é sua competente direção, em especial na terceira e última parte da fita. É interessante notar o desempenho do cineasta na manipulação do público, tanto na ambiguidade dos primeiros atos quanto na tensão que se estabelece ao final, quando as máscaras caem de vez e a agonia toma conta da tela. A cena da festa de aniversário é o melhor exemplo do talento do diretor: a pouca iluminação contrasta com a música que contagia os convidados; uma mensagem é recebida; do lado de fora, cônjuges discutem; pouco tempo depois, um jovem casal organiza o salão no fim da noite – enfim, ficamos sempre na expectativa de algo muito sério que está por vir. Seja nos usos eficientes da luz e trilha sonora ou na edição precisa do longa, Legrand se apropria destes elementos para estabelecer uma conexão com o espectador: ele se torna íntimo daqueles personagens, praticamente tendo as mesmas sensações que eles.
Particularmente, confesso que poucas vezes saí do cinema tão perturbado, mexido, transtornado como depois de assistir Custódia. Para um diretor relativamente inexperiente, Legrand nos entrega um filme marcado por um excelente rigor cinematográfico. Artifícios técnicos (e psicológicos) são precisamente empregados para abordar um tema incômodo e, mais do que nunca, universal: a violência doméstica. O final apoteótico, por si, já fala muito e nos faz ficar com o filme na cabeça por muito tempo depois.
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