Zelig (Zelig)

Escrito e dirigido por Woody Allen, Zelig é, sem sombra de dúvidas, um dos trabalhos mais interessantes de sua carreira – infelizmente esnobado pelo público e ofuscado por outras de suas obras mais “famosas” (porém superestimadas, a meu ver). Propositalmente estruturado como um documentário, o filme narra a história de Leonard Zelig (o próprio Woody), um homem comum com uma característica bastante peculiar: ele tem a incrível capacidade de transformar sua aparência, bem como suas maneiras e até seu intelecto, de forma a adaptar-se ao ambiente ao seu redor. Internado em um hospital em Manhattan, seu caso chama a atenção da doutora Eudora Fletcher (Mia Farrow), que acaba se apaixonando pelo paciente.

02

O que faz Zelig ser um filme tão genial é a segurança com a qual Woody brinca com a narrativa. Se o próprio estilo pseudo-documentário já lhe traz possibilidades cômicas, Allen potencializa esta perspectiva com a ironia recorrente em sua filmografia. O cineasta segue firmemente o padrão “documentário” tradicional, inserindo elementos como as filmagens em preto e branco e os depoimentos de pessoas que teriam conhecido o protagonista, por exemplo. Para além disso, as técnicas de manipulação de imagens são bastante convincentes para a época (o longa é do início da década de 80): Zelig é visto em fotos ao lado de personalidades, como Al Capone, Charles Chaplin, F. Scott Fitzgerald e, pasmem, Adolf Hitler.

Mas Zelig não é apenas uma comédia crua e sem propósito. Zelig é também uma fábula atemporal sobre a inútil necessidade do ser humano de aceitação. Para Leonard, se adaptar aos demais ao seu redor era se sentir “aceito”, era estar “seguro” – daí sua transformação. Ser “igual” era para ele um instinto de sobrevivência, uma maneira de estar integrado ao todo. Cá entre nós: pouca coisa mudou deste então. Ainda hoje, é possível encontrar milhões de “Zeligs” sem personalidade, sedentos de atenção, tentando ser apenas mais um na multidão – as redes sociais estão aí para comprovar. Zelig consegue criticar esse comportamento através de uma trama repleta de humor, que ironiza até mesmo o sensacionalismo da imprensa e o culto às celebridades. É Woody Allen em grande forma – mais até do que em seus supostos momentos mais inspirados.

Publicidade

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.